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Artigos Médicos
Precisamos lutar contra a liberação do cigarro eletrônico
Publicada em 20/09/2024 às 15h26
Muitas palmas para os programas de combate ao tabagismo de nosso país.
Nos anos 90, 34% dos adultos inalavam as sete mil substâncias contidas na fumaça do cigarro. A competência dos programas antitabaco conseguiu incorporar normativas importantes (proibição de publicidades, mensagens educativas nos maços, ambientes livres do cigarro), além de promover um remodelamento na mentalidade da sociedade brasileira (o charme e glamour do cigarro virou algo nocivo e antissocial), base fundamental para redução consistente dos nicotínico-dependentes em nosso país. A pesquisa Vigitel do Ministério da Saúde não permite dúvida: apenas 9,2% dos brasileiros maiores de 18 anos seguem jogando diariamente no seu pulmão mais de 60 substâncias cancerígenas.
Acrescente-se ainda, que a nossa competência nessa guerra contra a força econômica da indústria do tabaco não para por aí. Enquanto os Estados Unidos e muitos países da Europa Ocidental permitem sem restrições o uso dos cigarros eletrônicos, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), respaldada em estudos científicos, saiu à frente e já em 2009 ratificou a Resolução Nº 46, proibindo a fabricação, comercialização, importação e publicidade dos cigarros eletrônicos (CE).
E no dia 24 de abril deste ano, a Resolução da Diretoria Colegiada RDC Nº 855/2024 consolida as determinações anteriores e determina a proibição do uso dos dispositivos eletrônicos para fumar (DEFs) em ambientes coletivos fechados, públicos ou privados.
Enquanto as entidades sanitárias do mundo inteiro, Organização Mundial da Saúde (OMS) e Organização Pan-Americana de Saúde (OPAS) inclusas, aplaudem todo esse trabalho desenvolvido no Brasil, a força monetária da indústria do tabaco, montada na sua avidez lucrativa, anda querendo impor seus argumentos lobistas a uma realidade científica, ancorada em diversos estudos e pesquisas e corroborados por associações médicas de todo o mundo.
Estamos falando da intensa discussão que tomou conta do Congresso, da mídia, da sociedade brasileira: o Projeto de Lei da senadora Soraya Thronicke, que libera geral o cigarro eletrônico em nosso país.
Uma discussão que põe em jogo a saúde, o bem-estar e a qualidade de vida dos jovens brasileiros.
Há de se convir que a aprovação desse projeto deve produzir impacto sem precedentes no imenso prestígio que o Brasil, conforme já referido, adquiriu ao redor do mundo pela qualidade e competência de seus programas na luta contra o tabagismo.
Dentro desse contexto, é indispensável informar que perde racionalidade a discussão do potencial de nocividade entre o cigarro convencional e o cigarro eletrônico - ambos altamente nocivos -, quando se percebe que a liberação do CE vai mesmo é promover uma realimentação das estatísticas do consumo do tabaco no país, com a inserção desenfreada dos jovens no universo de dependentes da nicotina. Com trágicas e inevitáveis consequências na qualidade de vida, na incapacitação para o trabalho, na mortalidade precoce de muitos brasileiros que vão se tornar dependentes de uma droga, que faz companhia com a cocaína no mesmo grupo das substâncias psicotrópicas.
Não se pode deixar de referir também que, diferentemente da propaganda falaciosa da indústria do tabaco, o usuário do CE tem três vezes mais probabilidade de se tornar dependente do cigarro tradicional do que uma pessoa sem precedentes no uso de nicotina. Mais grave: os jovens consumidores do tabaco, em qualquer de suas formas, desenvolvem uma propensão natural de serem fortemente atraídos pela “cannabis” e o álcool em excesso, conforme estudo desenvolvido pela Columbia University e Yale School of Public Health com mais de 50 mil estudantes de 13 a 18 anos de idade.
"UMA GRAVE AMEÇA Á SAÚDE PÚBLICA BRASILEIRA". Foi assim que 80 entidades brasileiras do mundo médico/científico se posicionaram em relação à aprovação do Projeto de Lei da senadora Soraya Thronicke. O manifesto divulgado dia 19 de agosto alerta ainda para os riscos de crianças e adolescentes usuários do CE tornarem-se dependentes do cigarro tradicional.
A grande expectativa é como irão se posicionar os parlamentares que representam os anseios e as vontades da sociedade brasileira? Objetivamente, são duas as alternativas: de um lado, a força econômica da indústria do tabaco com seus argumentos lobistas; na outra margem, as evidências científicas demonstrando o imenso potencial nocivo contido nos sabores agradáveis e no designer atrativo do cigarro eletrônico.
Com a palavra, a consciência, a dignidade e a sensibilidade social de nossos parlamentares!
Sebastião de Oliveira Costa
CRM-PB: 1630
Especialidade: Pneumologia e Alergologia. Dr. Sebastião é presidente do Comitê de Tabagismo da Associação Médica da Paraíba e membro da Comissão de Tabagismo da Associação Médica Brasileira